Como é bom se surpreender positivamente, não é? Especialmente quando essa surpresa vem quebrando um preconceito bobo. Admito, para minha vergonha, que acreditava que os elogios à obra O espadachim de carvão eram grandemente devidos ao prestígio do autor Affonso Solano — figura central do podcast MRG — com seus fãs, mas percebi estar redondamente enganado.
Confesso, ainda, que só comprei o livro porque estava numa promoção incrível, e mesmo folheando-o meu preconceito persistia — o uso de frases de efeito, separadas do resto do parágrafo por linhas vazias, me dava ainda mais a impressão de... como dizer... falta de talento literário? Apelação? Em tempo: ainda não aprecio esse recurso, mas, antecipando o elogio, isso não tira o mérito da obra de forma alguma.
O espadachim de carvão é uma história muito bem escrita, criada — perceptivelmente — com muito carinho pelo autor, e muito bem pensada. O mito de criação do mundo onde passa a aventura — Kurgala — é tão verossímil quanto muitos que se referem à criação de nosso próprio mundo, e geram questionamentos, em certo momento da obra, por que não dizer?, pertinentíssimos. Solano criou uma história despretensiosa e, por isso, livre de amarras. É um mundo tão diferente que — ao que me parece — lhe dá uma liberdade criativa imensa. (Engraçado que me senti, em alguns momentos, lendo uma história próxima a um Final Fantasy Tactics ou o XII, que se passam em Ivalice, por causa da multiplicidade de raças inteligentes...) Acompanhar essa aventura foi como revisitar os filmes de fantasia dos anos 90 :)
Tenho uma única reclamação em relação a OEdC: seu final. Não à história, mas à velocidade em que ele foi apresentado. Tive uma impressão assim ao ler: "Opa, agora vamos nos encaminhar ao final e... ahn? Acabou?" Foi um desfecho, mas o clímax me pareceu muito curto.
Mas agora, para aliviar de novo, um outro elogio: Affonso Solano não faz aquelas descrições maçantes de cenas de luta. Escritores fazem literatura; coreógrafos são os profissionais que têm que se preocupar com os movimentos executados. É terrivelmente chato ler que "tal personagens girou duas vezes e, ao mesmo tempo em que trocava a base das pernas, rechaçava a lâmina do oponente com a sua, e, aplicando um movimento ascendente blá blá blá..." Sério, isso é um porre. E essa é uma cena de luta bem descrita:
"Igi e Sumi saltaram das bainhas como relâmpagos, rechaçando as investidas das guandirianas com perfeição e fechando a primeira seção de movimentos com uma garganta perfurada, um rosto cortado e uma lança partida. A criatura desarmada tropeçou para o lado e recebeu com um grito a lâmina de Sumi entre as costelas. A de rosto ferido cambaleou para trás e caiu com as costas encouraçadas no chão liso ao lado de Enki' När, guinchando por ajuda."
Não precisamos saber a descrição anatômica dos lutadores enquanto duelam em câmera lenta. Precisamos saber o que resultou daquela luta. É preciso deixar elementos para que a imaginação do leitor complete, e isso Solano faz bem também com outros elementos. Vi leitores reclamando da pouca descrição das espécies diferentes, mas isso, para mim, é um ponto a favor, e não contra. Didatismo, para mim, é para livros infanto-juvenis. Ou para autores que não dominam a arte — e nenhuma dessas duas sentenças serve para Affonso Solano.
• Livro: O ESPADACHIM DE CARVÃO •
• Autor: AFFONSO SOLANO •
• Editora: Fantasy / Casa da Palavra / LeYa •
Personagens: ★★★★☆
Trama: ★★★★☆
Escrita: ★★★★☆
Ambientação: ★★★★★
Revisão: ★★★★☆
Capa: ★★★★☆
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