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sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

Um trecho marcante de China Miéville


— Bem, depois de descobrir quão pouco sabe sobre eles, acho bom parar de falar com você — disse Isaac.
E para seu espanto, o queixo de Ged caiu.
— Brincadeira, Ged! Ironia! Sarcasmo! Você sabe uma caralhada de coisas sobre eles. Ao menos comparado comigo. Eu estive folheando Shacrestialchit e você acaba de me dizer mais do que eu sabia sobre o assunto. Sabe algo sobre... ahn... o código penal deles?
Ged o encarou. Seus imensos olhos se estreitaram.
— O que você está aprontando, Isaac? Eles são tão igualitários... bem... a sociedade deles é toda baseada em maximizar a escolha para o indivíduo, e é por isso que eles são comunísticos. Isso garante a mais livre escolha para todos. Pelo que me lembro, o único crime que eles têm é privar outro garuda de escolha. E isso pode ser acentuado ou atenuado, dependendo de ter sido feito com ou sem respeito, coisa que eles absolutamente adoram...
— Como se rouba a escolha de alguém?
— Não faço ideia. Suponho que, se você quebra a lança de alguém, isso significa privar a pessoa de usá–la. E, se você mente sobre a localização de algum líquen gostoso, pode privar outros da escolha de ir pegá–lo... 
— Talvez alguns roubos de escolha sejam analogias de coisas que consideramos crimes e outras não tenham absolutamente nenhum equivalente — disse Isaac.
— Suponho que sim.
— O que é um indivíduo abstrato e um indivíduo concreto?
Ged encarava Isaac, maravilhado.
— Caralho, Isaac, você fez amizade com um garuda, não fez?
Isaac ergueu uma sobrancelha e assentiu rapidamente.
— Filho da puta! — Ged deixou escapar, e as pessoas das mesas ao redor se voltaram para ele com uma leve surpresa. — E um garuda do Cymek! Isaac, você tem que fazer que ele... ele?... ela?... venha falar comigo sobre o Cymek!
— Não sei, Ged. Ele é meio... taciturno.
— Ah, por favor, por favor...
— Tudo bem, tudo bem, vou pedir a ele. Mas não espere grande coisa. Agora me diga qual é a diferença entre uma porra de um indivíduo abstrato e outro concreto.
— Ah, isso é fascinante. Imagino que você não tenha permissão de me dizer qual é o trabalho... É, achei que não teria. Bom, simplificando, e pelo que entendo, eles são igualitários porque respeitam demais o indivíduo, certo? E você não pode respeitar a individualidade de outros concentrando–se em sua própria individualidade de forma abstrata e isolada. A questão é que você só é um indivíduo enquanto estiver inserido numa matriz social composta por outros indivíduos que respeitam sua individualidade e seu direito de fazer escolhas. Isso é a individualidade concreta: uma individualidade que reconhece que sua existência se deve a uma espécie de respeito comunal da parte de todas as outras individualidades e que, portanto, é melhor respeitá–las da mesma forma. Assim, um indivíduo abstrato é um garuda que esqueceu por um tempo que é parte de uma unidade maior e que deve respeito a todos os indivíduos que escolhem."

China Miéville – Estação Perdido


quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Um trecho marcante de Joseph Fink & Jeffrey Cranor


Como editora do Diário de Night Vale nas últimas três décadas, Leann presenciara a popularidade constante e o repentino declínio do jornalismo impresso. 
Muitas de suas ideias tinham uma boa relação custo–benefício (reduzir para quatro edições por semana). Algumas pareciam ideias boas, mas falhavam por razões inesperadas (substituir as edições nos jornaleiros por leite semidesnatado, que, ao que parece, estraga depressa ao sol). E algumas eram extremamente bem–sucedidas (atacar blogueiros independentes com machadinhas). 
A última era uma decisão controversa, pois atacar uma pessoa com uma machadinha (ou com qualquer outra coisa) é tecnicamente um crime. Mas Leann contornava a situação usando argumentos semióticos com a polícia sobre a diferença entre um ataque e um plano de negócios. “Eu tenho um diploma de MBA", dizia ela com frequência aos oficiais de polícia. Poucos policiais têm MBA, por isso eles raramente discutiam com ela."

Joseph Fink & Jeffrey Cranor — Welcome to Night Vale



quinta-feira, 30 de novembro de 2017

Análise de Veludo Azul, de David Lynch


Veludo azul é um filme de 1986, dirigido e escrito pelo maluco David Lynch. Eu o assisti pela primeira vez essa semana, e já previamente preparado para a loucura que encontrei no outro filme que vi dele, o Cidade dos sonhos, terminei a experiência levemente incomodado — Veludo azul parecia linear demais. “Redondinho” demais. Contudo, a amiga que me apresentou o cineasta me disse: “Lembre–se; é uma obra do Lynch. Existem camadas, sempre.” E então começamos a conjecturar, e eu reassisti ao filme. Naturalmente, esse texto é voltado para quem já o assistiu, também.


O plot padrão — vamos dizer assim — do filme é simples: o pai de Jeffrey Beaumont sofre um derrame, e ele tem então que voltar para a casa dos pais para ajudar na loja. Na volta do hospital ele encontra uma orelha decepada no meio do mato, e a leva a um vizinho policial. A filha do vizinho, Sandy, diz que tem pistas — ouviu que uma cantora, Dorothy Vallens, pode ter algo a ver com isso. Jeffrey, então, invade o apartamento da cantora e descobre que ela é vítima de Frank Booth, um lunático psicopata que sequestrou seu marido e filho. Frank abusa dela em troca de “cooperação”, e Jeffrey logo se vê envolvido com tudo isso de um modo que não pode mais fugir. Ele leva uma surra de Frank e seus capangas, descobre que um policial parceiro do pai de Sandy está envolvido com Frank, em meio a um esquema de drogas e o escambau. E, no fim, claro que tudo dá certo.

Mas, sejamos sinceros — esse é um filme de David Lynch, poxa. E as camadas?

“Pode tudo ter sido um sonho”, disse minha amiga. Mas, se sim, foi um sonho de quem? Após queimarmos muitos neurônios, chegamos à explicação mais satisfatória: tudo foi, na verdade, um sonho do pai de Jeffrey — ou um delírio, ou uma lembrança, uma vontade de corrigir as coisas do passado, desencadeada pelo derrame. Ele, então, seria o verdadeiro protagonista do filme. A icônica cena do começo, onde a câmera entra por baixo da grama verdinha e mostra os insetos nojentos embaixo, não mostra só a corrupção do mundo por baixo da aparente beleza; mostra também a corrupção por baixo do pai de Jeffrey.

Então a história se passa no passado, na verdade? Sim! As músicas são um ótimo exemplo disso: são sucessos dos anos 50 — época do fim da juventude do protagonista. Outro bom exemplo disso é que, quando a história realmente começa — após o derrame —, o outdoor que dá boas–vindas à cidade de Lumberton é muito semelhante a uma peça dos anos 50/60.


Por que, então, o protagonista se apresenta como Jeffrey? Como eu disse, há um desejo de reparação. Ele cria um personagem, em sua cabeça, semelhante ao filho — bom, honesto, inocente, que irá corrigir as coisas erradas do mundo. Só que esse personagem, no entanto, não existe! Ele — Jeffrey, o protagonista — e Frank são a mesmíssima pessoa: um, o que aparece para a sociedade; o outro, o monstro que aparece sob efeito de drogas, que bate em Dorothy e a estupra. Existem algumas dicas para isso durante o filme:
• Dois personagens podem ser a mesma pessoa, nesse filme. É assim com o Double Ed, que ajuda Jeffrey na loja. Jeffrey se refere a ele no singular, mas são dois atores. Isso pode ser um reflexo do inconsciente do protagonista. 
• Na cena do espancamento de Jeffrey, Frank diz a ele: nos meus sonhos você é todo meu, usando a letra da música de Roy Orbison que está tocando; além disso, Frank passa batom e beija Jeffrey, e ambos ficam parecidos, com as bocas borradas. 
• Jeffrey diz a Sandy, após o espancamento, que vai voltar ao apartamento de Dorothy porque está descobrindo coisas que sempre estiveram escondidas. 
• Além disso, depois do espancamento, Jeffrey chora ao lembrar de quando ele “fez a transição” e bateu em Dorothy quando provocado. É como se ele não controlasse a “personalidade Frank”.
• O sobrenome de Frank é Booth, muito semelhante a “both” — ambos, em inglês.
• Dorothy diz a Sandy, no final, que Jeffrey “passou sua doença para ela”. Que doença seria essa? A loucura, talvez.
• Não haveria maneira de Dorothy saber onde Jeffrey morava, se já não houvesse entre eles um envolvimento anterior.
• Além disso tudo, Sandy diz a Jeffrey, em um momento, que não sabe se ele afinal é um detetive ou um pervertido, e ele responde que ele sabe, mas ela (assim como nós) terá que descobrir. 
Sendo assim, o protagonista inventou esse personagem, esse detetive justiceiro, inspirado na imagem do próprio filho, para criar uma versão convincente a si mesmo de que fez algo de bom, afinal.



Sobre a questão das drogas: parece–me claro que Ben, o doidão que dubla a música In dreams e que mantém o marido e filho de Dorothy em cativeiro, é o fornecedor. Ele e Frank se vangloriam de terem despistado o policial corrupto que aparece sempre de terno amarelo. Se Frank é mesmo Jeffrey, faz sentido ele ter se disfarçado do “homem que se veste bem” para tirar as fotos remotamente e as entregar para o pai de Sandy, incriminando o policial de terno amarelo. Faz sentido, também, Jeffrey ter perguntado para Sandy se ela reconheceu o homem de amarelo que bate à porta do apartamento de Dorothy antes dela, na “primeira incursão” ao apartamento. Quando ela diz que não o reconheceu, ele então desconversa. O policial corrupto, assim, acaba sendo o “vilão” da história, morto no final.

O final, então — a morte de Frank —, pode ser um ato simbólico, do momento onde a personalidade Jeffrey vence a personalidade Frank, graças ao amor de Sandy (ou, no caso, da mãe de Jeffrey, personalizada na figura da namorada de Jeffrey)… e a uma certa dose de oportunismo.

Se você ainda está achando que faltam elementos que corroborem essa teoria de o filme — ou, ao menos, o tempo de filme correspondente ao da internação do pai de Jeffrey — se passar inteiramente na mente do protagonista, eis outros detalhes:
• Todos os figurantes aparecem estáticos — o homem com o cachorro no começo do filme; os figurantes da casa de Ben; o policial de amarelo que já estava morto mas ainda de pé no final… É como se o protagonista se lembrasse de que estavam lá, mas não do que eles faziam.
• Esse período do filme se passa entre os momentos em que a câmera entra e sai de duas orelhas, e vale lembrar que ela entra em uma orelha esquerda e sai de uma direita, como se estivesse passando por dentro da cabeça. Lembrem–se: Lynch não dá ponto sem nó.
• O marido e o filho sequestrados de Dorothy só são mostrados quando já não representam tanto remorso para Jeffrey/Frank — o marido quando está morto, com a culpa caída sobre o policial corrupto, e o filho quando está com a mãe. (O marido, inclusive, é mostrado morto com um tiro no olho — talvez, mostrando que o defeito dele foi ver o que não devia (Jeffrey, inclusive, se mostra incomodado com isso na figura de Double Ed no começo, que sabe quantos dedos ele mostra mesmo sendo cego — ou seja, sabe coisas que não deveria saber). Talvez ver e ouvir o que não devia, já que ficou sem uma orelha também.)

Existem ainda algumas lacunas? Sim, sempre! É um filme do David Lynch, pô, haha! Contudo, me recuso a crer no filme policial–noir redondinho que nos é passado na primeira leitura. Nada é tão simples nos filmes desse cineasta, e, no final, está lá o passarinho que não me deixa mentir — encarando os personagens, ele mostra que tudo bem, o amor venceu, mas olha o besouro nojento ali, bem na cara de todo mundo, escondido nos cantos sombrios, debaixo das fachadas do mundo.



quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Um trecho marcante de Stephen King #2


Mas naquele ano há mais alguma coisa: uma sensação de coisa errada a que ninguém saberia realmente dar voz. Pessoas que nunca tiveram um pesadelo na vida acordarão aos gritos durante a semana do fin de año; homens que se consideravam pacíficos acabarão não apenas se metendo em brigas de socos, mas instigando–as; garotos rebeldes, que em outros anos só sonhariam em fugir de casa, naquele ano realmente o farão, e a maioria não voltará após a primeira noite dormindo na rua. 
Há um senso — inarticulado mas muito presente — de que as coisas não correram bem naquela estação. É o encerramento do ano; é também o encerramento da paz. Pois é ali, no sonolento Baronato de Mejis, no Mundo Exterior, que o último grande conflito do Mundo Médio em breve começará; é dali que o sangue começará a correr. Em dois anos, não mais que isso, o mundo como até então existiu será liquidado. Começa ali. De seu campo de rosas, a Torre Negra grita com sua voz de animal. O tempo é uma face na água.



domingo, 5 de novembro de 2017

Antologia Mitografias vol. 1: Mitos modernos!


E finalmente saiu a primeira antologia de contos do site Mitografias, a Mitos modernos, onde saiu um conto meu e que eu tive o prazer de revisar :)


A proposta dos organizadores — o Leonardo Tremeschin, criador do site Mitografias; o Andriolli Costa, do site Colecionador de Sacis; e o Lucas Rafael Ferraz, da revista Trasgo e do site Leitor Cabuloso — foi abordar mitos clássicos, de quaisquer mitologias, em roupagem atual, nas cidades, no nosso mundo contemporâneo. Claro que, uma vez que meu mundo de fantasia (apresentado em O arquivo dos sonhos perdidos e mais esmiuçado nos contos Noturno deserto, Lugar nenhum e My shadow plan) é basicamente isso, não perdi tempo em enviar um conto para o site organizador. Meu conto foi aprovado e meu prazer só foi maior porque o Lucas, que conhece meu trabalho, conversou com o pessoal do Mitografias e acharam por bem me convidar para ser o revisor da obra. Espero ter feito um bom trabalho :)

Vou aproveitar e fazer, então, uma breve apresentação sobre cada um dos contos.

Calada, de Isa Prospero
Este é um conto policial que se passa na Itália. Muito bem escrito, muito bem desenvolvido e com um timing excelente. Quando fiquei sabendo que foi a primeira coisa publicada da autora, fiquei bobo. Tem muito futuro! Na trama, corpos começam a aparecer, e as mortes claramente foram causadas por alguma coisa muito incomum — até mesmo para a detetive Carmina Sordi, que investiga unicamente esse tipo de coisa. Calada foi uma excelente escolha para abrir a coletânea.

Mãe de fogo, de Bruno Leandro
Um conto de fantasia, onde nos é apresentado um mundo com mestres de magia e pupilos, realidades paralelas e lugares fora do tempo. O personagem principal é Inácio Flores, que está aprendendo melhor os detalhes de tudo que o cerca.

Coração dedo–duro, de Romeu Martins
Um conto de fantasia, mas também de comédia. Bem curto, mas bastante divertido, atualizando de maneira inteligente e criativa um mito bem antigo :)

Sinfonia da saudade, de Jana P Bianchi
Tenho dificuldade em dizer se este é ou não o melhor conto da coletânea. É realmente muito bom. Conta a fantástica história de Akil e de Januário; como eles se conhecem e se ajudam. É uma história sobre memória, sobre saudades e sobre a amizade. Jana Bianchi mandou realmente muito bem aqui, e depois de ter lido o livro dela pela Dame Blanche, o Lobo de rua, percebo que ela está se tornando uma das melhores autoras de fantasia dessa nova geração.

Sem cabeça, de Andriolli Costa
O primeiro conto dos organizadores da coletânea, e felizmente vemos que eles não estão aqui por nepotismo, haha. Nesse conto, também de fantasia, somos apresentados ao divertido padre Ignácio, que vem investigar o evento conhecido como O massacre de São João del Rei, e bagunçar as coisas por ali, hehe. A mitologia brasileira é muito bem representada, e a crítica social é muito pertinente.

Ponte para o acreditar, de Paulo Teixeira
Praticamente uma fábula, esse conto apresenta uma família bem diferente e amorosa — Megan e Carmen, e sua filha Bianca —, e sua trama mostra como essa família foi formada, superando todas as dificuldades e preconceitos. Apesar de parecer uma história no passado, na realidade se passa no futuro, e isso dá um nó legal no cérebro, haha.

E tudo vai ficar pior, de… eu :)
Esse é o meu conto — para variar, de fantasia. Acho que era inevitável a maioria dos contos serem deste gênero, em se tratando de uma coletânea de mitologias reimaginadas. Enfim. Meu conto é passado em Acqua, a versão da Terra apresentada no meu romance O arquivo dos sonhos perdidos. Pode ou não ter relação com aquela história, mas isso não faz diferença aqui. Acabou sendo o maior conto da coletânea, e tive a felicidade de ter sido selecionado antes de ter sido convidado para revisar o livro :) Espero que gostem.

No olho do furacão, de Cassiano Rodka
O conto mais curto da coletânea e, apesar da temática, não é, de fato, um conto de fantasia. Tem uma pegada meio Deuses americanos, e sua atmosfera é muito bem construída, bem noir e marcante.

Esculturas perfeitas, de Leonardo Tremeschin
Outro conto de outro dos organizadores. Apesar de não ser “escritor de nascença”, o autor cria uma história muito interessante, que surpreende e inverte papéis numa mitologia que poderia ter sido aproveitada de maneira bem mais convencional — e felizmente não foi :)

O voo das deusas–pássaro, de Ana Lúcia Merege
Outro forte concorrente a melhor da coletânea. A autora utiliza muitíssimo bem o discurso indireto livre, e tem um estilo totalmente consolidado. Tenho até dificuldade em falar dessas narrativas boas sem abundar em adjetivos e advérbios, haha. O conto — outro que tem carinha de fábula — conta a história do casal Riad e Ana Maria, que estão com dificuldades de engravidar. É, na verdade, um conto sobre o amor e a compreensão.

A proclamadora (ou uma história sobre cactos), de Alessandra Barcelar
Esse é um conto… diferente. A autora tem um estilo todo próprio, e sua prosa é altamente poética. O tema “mitologia” aparece aqui de forma fortemente figurada, e não estou certo sobre meus sentimentos sobre ele, hehe. (O Lucas me advertiu, quando da revisão: talvez haja um conto que não seja bem o seu estilo :P) Gostei dele, mas ainda não sei bem por quê.

Gerente de sinistros, de Lucas Rafael Ferraz
Outro conto policial (e do terceiro dos organizadores), mas dessa vez o protagonista não é um policial — é um investigador sobrenatural, Constantino, que acaba envolvido com algo bem maior do que ele esperava. O conto, escrito no presente como tempo verbal, gera uma ótima sensação de imersão na investigação.

Como vencer o Minotauro, de Saulo Moraes
O segundo conto de comédia da coletânea — e outro que atualiza de maneira muito divertida uma mitologia clássica bem conhecida. Aliás, que a subverte totalmente, haha. O personagem principal é o principal concorrente do personagem do título, numa acirrada competição de… stand–up comedy.

Intermitências, de Michel Peres
E eis o terceiro concorrente a melhor conto, e o único conto de ficção científica. Michel Peres é, aliás, um autor que está se destacando bastante nesse gênero (compensa demais, inclusive, ler o conto dele que saiu no Leitor Cabuloso). No formato de entradas de um blog, o conto tem um quê de terror, gerando um estranhamento bem desconfortável — mais uma vez, ponto para o autor.


Então é isso. Foi um prazer revisar e fazer parte dessa coletânea, e espero fazer novamente os dois papéis se houver um “volume 2”. Recomendo — desnecessário dizer, até — fortemente o download do e–book, neste link, e espero que todos gostem tanto do resultado quanto eu gostei.



segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Wild cards vol. 1: O começo de tudo, editado e organizado por George R R Martin


E finalmente, após muito postergar, li o primeiro volume da série Wild cards! E já confessando logo de cara: não esperava que fosse tão legal :D


Wild cards vol. 1: O começo de tudo pode ser considerado um romance fix–up — isto é, um daqueles livros formados por contos que se interligam para compor uma narrativa maior. A ideia original da trama é do consagrado George R R Martin, assim como a edição e organização da obra. Ele deu o pontapé inicial e editou os contos dos autores convidados, para que respeitassem os acontecimentos uns dos outros e dessem prosseguimento à narrativa.

Podem surgir dúvidas a respeito da coesão e da continuidade dos fatos, mas creiam–me: é tudo muito bem–feito. Os personagens que aparecem em diferentes contos mantêm suas personalidades, os elementos apresentados em certos contos são sempre respeitados e, por isso mesmo, impactam em todos os posteriores. A única diferença entre os, digamos, capítulos dessa história são os estilos diferentes entre os autores (mas nem eles são tão diversos assim, talvez tenha sido por causa da tradução para o português).

Mas, afinal, sobre o quê é Wild cards? Pois bem. O que dá nome à obra é um vírus alienígena que é solto na Terra, nomeado de carta selvagem. Nesse evento trágico, milhares de pessoas morrem e muitas outras ficam infectadas. Enquanto algumas sofrem mutações terríveis — e são por isso, para manter o padrão da nomenclatura, chamadas de curingas —, outras desenvolvem poderes especiais, de todos os tipos — verdadeiros super–heróis, chamados então de ases. A questão é: Wild cards fala sim sobre super–heróis, mas o foco dela é, por assim dizer, bastante realista. Assim sendo, como seriam tratados os heróis — e os deformados, os curingas — em nossa sociedade intolerante, medrosa e preconceituosa? E, para piorar, a contaminação se dá no ano seguinte ao fim da 2.ª Guerra Mundial, naquele clima gostoso de desconfiança e polarização em que o mundo estava. (“Estava”…?) Chego agora à conclusão do que eu disse a um amigo, ainda durante o processo de leitura: Wild cards aprimora, de forma madura e crua, as questões civis que X–Men introduziu.

Todos os personagens, tanto curingas quanto ases e humanos, são muitíssimo bem construídos. São totalmente verossímeis, ainda que façam coisas absurdas. É muito interessante acompanhar o personagem, desde a descoberta de seu poder até o surgimento de sua fama. Como esse livro mesmo diz, este é apenas o começo de tudo, e a série é grande. Surgirão heróis e vilões — mesmo porque o vírus pode ficar latente na natureza até encontrar um hospedeiro, ou mesmo dentro dos organismos —, e alianças e rivalidades serão construídas, mas este volume é um excelente passo inicial nessa jornada. Eu ando bastante reticente em ler séries grandes, estou mesmo fugindo delas, mas em relação a essa não teve jeito: já comprei o volume 2.

Jetboy

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Limbo, de Thiago d'Evecque


— Oi, você já leu o Limbo?
— E Limbo, você leu?
— Sabe um livro legal? O Limbo!
— Olha, saiu um livro novo daquele rapaz que escreveu o Limbo, você já leu?

Esse é um compilado do tipo de coisa que eu venho escutando há um tempo, rs. Queria eu gerar o mesmo envolvimento.

Assim sendo, o que eu poderia fazer a não ser ler esse tal desse Limbo? Então eu li.




E vou começar já dizendo que, até lá pelos seus 20%, a obra não tinha me convencido. Foi um amigo que me convenceu a continuar. Entendam: não é que estava ruim; eu só tinha a impressão que estava sentado numa arquibancada vendo uma escola de samba passar. “Olha essa ala, que bonita. Ah, essa ala eu não gostei muito. Ah, é mais interessante" — e por aí vai. Seguimos, na “trama", um personagem que precisa reunir doze “personalidades" presentes no Limbo — o lugar para onde as pessoas vão ao morrer — para voltar à Terra e ajudar as pessoas, já que as coisas aqui estão indo de mal a pior. Esse protagonista tem a companhia de uma arma mágica na missão e... é isso.

Mas qual é realmente o ponto negativo da obra? Então: nenhum. O protagonista é bem construído e sua arma mágica é uma figura, divertida e desbocada. Boa parte da diversão é descobrir quem ambos são, ao longo da narrativa. Os personagens secundários — os 12 — são variados, cada um de uma mitologia, e são memoráveis; suas histórias são interessantes e não fica massante acompanhar a busca de todos eles justamente por causa disso. E é aí, eu percebi ao continuar a persistir na leitura, que está a graça do livro: conhecer e acompanhar personagens, ainda que tudo o que eles façam seja ir do ponto A ao ponto B.

Devo, no entanto, me corrigir — há, sim, um ponto negativo em Limbo: quando ele fica realmente bom ele acaba. Thiago d'Evecque, ouça: você NOS DEVE uma continuação da história. Quero muito saber onde foram parar cada um dos 12, e se a última prece do protagonista foi atendida. E, se possível, haha, quero que eles vão parar na Terra também. (Fica ainda uma dica: prestem atenção nas referências — em uma delas eu rachei de rir :'D)

sexta-feira, 13 de outubro de 2017

Nefelibata ou O fotógrafo


E está lançado meu segundo romance, Nefelibata ou O fotógrafo, em formato e–book na Amazon!






Ellijah descobre que gosta de fotografar ao ganhar de Lorena, sua esposa, um celular que tira fotos. E melhor ainda: ele percebe que tem tino para a coisa. Ao mesmo tempo, o português Maximilian surge em sua vida e se torna um amigo, ampliando, com seu modo diferente de ver o mundo, seus horizontes fotográficos. Mas esse é um “hobby” que toma dinheiro — e sua esposa começa a apresentar uma doença misteriosa. O dinheiro não será suficiente para cuidar de tudo, e Élli precisa escolher entre seu novo sonho — ser um fotógrafo de natureza — ou abrir mão de tudo por Lorena. O problema é que ele nunca foi muito bom em tomar decisões.

Para comprá–lo, basta acessar este link:


quinta-feira, 28 de setembro de 2017

Vem novidade por aí…


Ainda que eu não vá dizer realmente nada com esta postagem, posso adiantar a vocês, nobres leitores do blog, que uma novidade está surgindo no horizonte.

E no horizonte próximo, diga–se de passagem ;)


segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Unicelular, de Tarsis Magellan


Que surpresa foi o romance Unicelular, do manauara Tarsis Magellan! Não que eu não tenha me interessado por ele desde o início, no Wattpad, e depois quando veio para o Clube de Autores, e, finalmente, após comprar o meu Kindle, onde o comprei na Amazon! Inclusive, na época do Clube, ele entrou no meu desafio; assim sendo...

.: Este é o terceiro livro do Desafio Literário Clube de Autores, de um total de 7 livros! :.


Para começar a falar do romance, quero fazer um exercício com vocês, leitores: pensem em elementos de filmes norte–americanos de sucesso — é bem possível que eles estejam em Unicelular. Temos uma protagonista policial forte e decidida; um parque temático com criaturas fascinantes e incrivelmente perigosas; elementos de ficção científica que estão diretamente relacionados ao nosso dia a dia; mortes deliciosamente estapafúrdias; conspirações; empresas gigantes e inescrupulosas destruindo o meio ambiente; cenários futuristas, meio alienígenas e impressionantes em sua execução; explosões!; robôs; e o melhor de tudo, a única coisa que não se encontra em Hollywood: a história se passa no Brasil, em meio a cenários que todos nós, se não conhecemos, já ouvimos falar. E, creiam–me: nada disso — absolutamente nada — ficou forçado. Desculpem se pareço empolgado, é que estou mesmo, hehe.

Mas, afinal, o que acontece no livro? Para simplificar, sem spoilers: Uma agente da ABIN — a versão brasileira Herbert Richers da CIA — manda sua melhor agente, Rosa Villar, para investigar a Iniciativa Unicelular, depois que acidentes com pessoas no litoral começam a demonstrar um padrão. Lá, os cientistas da Iniciativa estão montando um parque temático onde as principais atrações são os organismos unicelulares... mas não exatamente como eles deveriam ser. No entanto, no decorrer de suas investigações, Rosa percebe que as coisas não são bem como ela imaginava (e nós, leitores, também, já que a trama vai por caminhos inesperados o tempo todo). Mas, Rahmati... Afinal, a história é de ficção científica, policial ou um thriller? É tudo isso! E funciona muito bem!

O autor, Tarsis Magellan (gosto desse nome, porque me lembra o meu disco preferido da banda Savatage, o The wake of Magellan), escreve muito bem, e seu estilo, como eu acho que deve ser nesse tipo de história, não se sobrepõe à trama; ele não inventa a roda, apenas a usa muito bem, com rolamentos novos e pneus de boa qualidade, hehe. Apesar de ser um lançamento independente, não encontrei grandes erros, nem de português nem de diagramação (claro, existem alguns, mas inofensivos). A capa, inclusive, é linda, e passa muito bem a ideia da trama.

Em resumo, depois de tudo o que eu falei: é um livro que eu indico MUITO. Merece ser comprado na Amazon, merece ser comprada a sua versão física, que ainda vai ser lançada (foi retirado do Clube de Autores), porque parece que está ficando muito bonita, e o autor merece ser publicado numa grande editora. Inclusive, ele eleva bastante a expectativa por suas futuras produções.

Unicelular, assim sendo, leva um belo dum 4,5 de 5. Fez comigo, inclusive, o que muitos poucos livros fazem ultimamente: me deixou com saudade do cenário onde se passa :)

quarta-feira, 20 de setembro de 2017

A menina submersa: Memórias, de Caitlín R Kiernan


Uma das poucas coisas que realmente me estressam, na literatura, é me sentir enganado. Não fico “bravo" quando leio uma obra mal escrita; eu simplesmente faço uma careta e a abandono. Também não fico “bravo" quando chego a um final ruim de um livro; dependendo de como foi a jornada, eu somente penso: “ah, bem que essa história merecia um final melhor..." (Lost, é com você, minha filha.) Mas quando uma obra me engana... Ah, aí eu fico fulo. É verdadeiramente uma traição. O principal exemplo, para mim, disso, é o livro Grande irmão, como mencionei nesse desabafo aqui.

Em A menina submersa: Memórias, não é exatamente a obra que me enganou — foi como a venderam para mim.


Em todas as artes, textos e etcéteras promocionais da editora Darkside, esse livro é vendido como um livro de terror. Ou, ao menos, um terror psicológico. Tudo bem que a protagonista começa o livro dizendo que vai contar uma história de fantasmas — no entanto, não é uma história de terror. Se você, leitor do blog, quer ler esse livro por causa disso, repense. A menina submersa é sim uma história de fantasmas, com sereias e lobos, mas são os fantasmas, sereias e lobos da protagonista, India Morgan Phelps, ou Imp, porque ela é esquizofrênica. Não, isso não é uma interpretação minha. Sim, isso está escrito no livro. Que é narrado em primeira pessoa. Pela protagonista. Que não deixa dúvidas. É a história dela, como ela se lembra, e inventando o que não lembra. Pode ser que tenha um ou outro elemento fantástico? Sim, pode. Mas não é esse o foco. Não é uma história de terror. É uma ótima história que destrincha, que escarafuncha, que desnuda a cabeça de uma pessoa perturbada por uma doença que rouba dela qualquer controle que ela tenha de sua mente — e isso, não tenham dúvidas, é muito bem feito —, mas não é a história que eu esperava ler quando abri o livro. Porque quem gosta de ler sabe que é preciso estar numa vibe adequada àquele livro. Quando se está com aquela puta vontade de ler uma fantasia épica e a única coisa que se tem em mãos é um Orgulho e preconceito ou um A moreninha, é óbvio que não se extrairá o que essas obras têm de melhor.

A menina submersa é um bom livro, que fique claro. Não é excelente, contudo. Apesar de ter adorado as viagens da protagonista e os problemas de relação dela com as mulheres de sua vida, Eva e Abalyn, achei o livro denso e arrastado demais. Talvez, como eu disse, por ter esperado outro tipo de narrativa. A diagramação é boa, com “supresinhas" ao longo das páginas, e a relação toda da protagonista com a arte em geral é bem legal, ainda que sempre envolta nesse véu de confusão e estranheza de todo o livro.

quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Picta Mundi, de Gleice Couto


Picta Mundi, da autora Gleice Couto, chamou a minha atenção desde o primeiro momento em que descobri sua existência, na bela e amada lista de e–books gratuitos da Amazon, hehe. Gostei da capa, do título, e, posteriormente, da sinopse. Vi que se tratava de uma história onde, por qualquer motivo, se era possível entrar nos mundos — ou nas realidades alternativas — dos quadros, das pinturas, e isso falou muito comigo, porque são duas coisas que eu curto bastante, realidades paralelas e óleo sobre tela.


Picta Mundi, como vocês já devem ter suspeitado, é uma obra independente. Faz tempo, contudo, que isso deixou de ter, para mim, algum significado além do óbvio — o de não ter uma editora. Atualmente, muitos escritores (eu arriscaria dizer a maioria) estão tomando cuidado com suas “edições do autor", procurando revisores, leitores beta, leitores críticos e capistas, e isso reflete em obras como essa. Aqui, a diagramação é muito boa, os capítulos iniciam com um desenho de uma pena, a revisão do português está ótima, enfim; o trabalho é melhor que, inclusive, o de algumas editoras por aí. Mas e a trama?

Trata-se, também, de uma história young adult. Nela, acompanhamos, no começo, Letícia e Daniel, alunos do colégio Dippel, que se encontram na diretoria para receberem suas detenções. A escola é de alto nível, e ambos parecem não se encaixar muito bem naqueles padrões. Logo percebem que têm algo em comum: ambos perderam pessoas próximas. Daniel perdeu seu irmão, Felipe, desaparecido, e Letícia seu pai, Raul, que morreu em condições incertas. A vida de ambos desandou a partir desses eventos. No entanto... Daniel diz a Letícia que as coisas não são bem assim. Felipe não desapareceu, na verdade, e está com o pai da menina em um mundo paralelo, acessado por meio de pinturas especiais. E precisa da ajuda dela para fugirem. (E, é óbvio, ela acha que ele tá muito doidão de dorgas.)

Enquanto a ideia é excelente — e criativa, porque não me lembro de muitas obras parecidas —, a execução é, para mim, vale frisar, “apenas" boa. Entendam: o livro é bem escrito, não há falhas na trama nem na continuidade, nada realmente que desabone. A autora conduz muito bem a história e os personagens. Contudo... meu problema é com o “estilo" young adult. Parece que não consigo me conectar muito bem... É curioso, porque nem é por qualquer bobeira do tipo “ah, as situações são inverossímeis", ou “os personagens são inseguros", ou “não gosto de adolescentes"; é que, nessas obras, eu meio que sinto como se estivesse assistindo a um “filme de Sessão da Tarde", se vocês entendem o que quero dizer com essa referência. Não estou dizendo sobre esse livro, mas me parece, ao ler uma obra desse gênero, que os protagonistas não vão realmente correr algum risco, sabe? Que eles vão sim conseguir o que querem no final, então parece que não consigo me conectar com os personagens. Certamente o problema é meu.

Para quem ama, entretanto, o gênero YA — e são muitas pessoas —, certamente vai adorar o Picta Mundi. Criativo, bem executado, bem escrito, e com personagens muito bem construídos, humanos até dizer chega. A protagonista, inclusive, chega a irritar de tanta humanice, haha. Vale a pena demais ;)

quinta-feira, 31 de agosto de 2017

Glamour, de Alexey Dodsworth


Alexey Dodsworth não decepciona, não me canso de dizer isso. Disse na minha resenha de Dezoito de Escorpião, disse na de Extemporâneo, digo nessa agora de Glamour, o terceiro lançamento do autor no ano de 2016 — nesse ano, também saíram a segunda edição de Dezoito e O esplendor, ambos pela editora Draco. Glamour, no entanto, foi lançado como independente, e fico curioso em saber por quê... apesar de ter uma suposição sobre o o motivo:

Imagino que seja por causa do quanto essa obra seja fora da casinha, surtada, ousada e cheia de quebras de preconceitos para esfregar na cara da sociedade tradicional. Talvez seja por isso. (Só espero que ele tenha partido para a publicação independente por conta própria, e não que tenha sido rejeitado por editoras por esse motivo...)


Vamos começar, então, pelas protagonistas. Sim, “pelas"; são três mulheres.

A primeira delas é a Nemy–Z, uma drag–queen de uns 2 metros de altura, que está sempre montada. Outra é a Leonor, idosa e esposa de Nemy–Z, que luta contra um câncer terminal. E a terceira é Cassandra “Cassie" Johnson, a — segundo absolutamente todos, linda — filha transgênero de cabelos azuis das duas (e que me trouxe muita alegria ao aparecer na obra, já que ela também é protagonista de Extemporâneo — ou uma versão dela de outra realidade —, e é muito carismática).

A questão é que as três não são “só" isso, hehe. Leonor tem a voz, que torna impossível não obedecer a qualquer coisa que ela comandar; Cassie tem visões do futuro de fatos e de pessoas; e Nemy–Z parece ter algo em si muito maior do que isso tudo (e a revelação de seu poder, no fim do livro, me parece ser um dos bons motivos para o livro ter saído independentemente). Além disso, as três têm um grupo pop cover chamado As Iluminadas de Thanateros, são complexas e indistinguíveis de seres humanos reais, com suas qualidades e defeitos. Tá bom ou quer mais?

Então tem mais.

Os vilões também são memoráveis. Dentre eles, um candidato à presidência ultra–conservador chamado Jairo Volpi e um cadeirante misterioso mas, ainda assim, que rende cenas muito divertidas. Aliás, a escrita do Alexey é fantástica — fluida, cheia de surpresas e com momentos muito bem amarrados. Só senti um pouco de falta, no final, da reaparição ou mesmo da menção de um personagem que tem uma “conclusão" no fim do primeiro ato, mas aí também já pode ser o próprio autor quebrando minhas expectativas e fugindo do clichê, haha.

Outra coisa que me agrada nos livros do Alexey é a costura que ele faz entre eles. Todos têm elementos uns dos outros, personagens, menções ou mesmo temáticas que giram em torno de um “Sol", mas mesmo assim nada é repetitivo ou previsível, muito pelo contrário. Como (acho que posso dizer com certa segurança) ele trata de universos paralelos, cada realidade que ele nos traz é única e, à sua maneira, incomodamente próxima à nossa dos piores jeitos possíveis.

Nota 5 de 5, fácil. Dá mesmo vontade de ler tudo de novo para brincar de encontrar os elementos comuns.

Acho que vou fazer isso.

Mas, antes, vou ler o livro que falta, O esplendor.

Aguardem novidades :)

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Podcasts: Biblioteca de Bolso, CabulosoCast e Caixa de Histórias


Combo de literatura! Três deliciosos podcasts sobre nossos amados livros para vocês conhecerem!



Esse é o único podcast de Portugal que eu ouço. É apresentado pela Inês Bernardo e pelo José Mário Silva, e o programa sempre gira em torno de um convidado — numa conversa presencial —, seja autor ou personagem do mercado editorial português. Mas aí você pode se perguntar: então o quê isso interessa a nós, brasileiros? Primeiro, que o formato é o seguinte: o convidado escolhe 3 livros que marcaram sua vida. A partir daí, ele e os hosts discorrem sobre a história, sobre as lembranças que o livro traz, sobre os personagens, os momentos marcantes... Eles literalmente humanizam a obra. Para um escritor, isso é um excelente meio de aprender como marcar os leitores de maneira indelével.


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Ah, o Cabuloso... Esse foi, por muito tempo, o meu preferido... Mas, como assim, “foi"? É, “foi", porque acabou. Fico muito triste, mas é a verdade. Nesse exato momento ainda vai lançar uns episódios, mas o fim está oficialmente anunciado, e não demora. Ele é apresentado pelo Lucien o Bibliotecário, host que conseguiu manter sua identidade em segredo por muito tempo, rs. Além disso, na equipe oficial, tem a Priscilla Rúbia, a Domenica Mendes e o meu brother de SobrEscrever, o Lucas Ferraz. São programas mais longos, mais de 1 hora, às vezes mais de 2, hehe, mas o papo é sempre muito descontraído, seja sobre um livro — com uma parte sem spoilers e uma com —, sobre um autor — com a participação do mesmo, quando possível — ou sobre um estilo literário. Já foi quinzenal, já foi semanal, e, nesse finalzinho, está praticamente mensal. É um programa que vai fazer muita falta :'(


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Esse é um podcast peculiar. É apresentado pelo Paulo Carvalho, e é construído num formato diferente. Como o Paulo é autor, ele faz, na primeira metade do programa, um “audiolivro", geralmente do primeiro ou segundo capítulos, ou de um conto, se for o caso. Na sequência, ele sozinho ou com um convidado apresentam e discutem sobre a obra, sem spoilers, apresentando–a aos ouvintes. É um programa que faz parte da “família B9 de podcasts", de duração variável — às vezes 25 min, às vezes 45 min ou 1 h —, e semanal, e muito legal :D


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quinta-feira, 17 de agosto de 2017

Podcasts: Alô Ténica, AntiCast e BrainCast


Continuando os posts onde apresento os podcasts que eu assino, trago agora três programas dos quais não ouço absolutamente tudo o que lançam, mas que, ainda assim, gosto bastante.



Esse programa é produzido e apresentado pelo Léo Lopes, e é um spin–off do podcast Rádiofobia. Nele, o Léo dá dicas e divide sua experiência no tocante à edição, produção e publicação de podcasts — ou seja, é praticamente uma metalinguagem, um podcast sobre podcasts. O “ténica", sem o C, inclusive, é grafado e falado assim propositalmente, como um jargão. O Léo Lopes é um excelente produtor e comunicador, e acompanhar esse programa é indispensável para quem se dedica ao formato. O Alô Ténica é um podcast mensal, distribuído por um feed próprio mas também pelo feed do Rádiofobia.


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O AntiCast é um dos maiores podcasts brasileiros da atualidade. É apresentado pelo Ivan Mizanzuk e começou como um podcast de design — ou de antidesign —, mas acabou evoluindo para ser um programa sobre... tudo, desde memes até política, religião, literatura e cinema. São sempre programas longos, beirando as 2 horas de duração, e é semanal. Como não tem muita edição — no máximo a vinheta inicial, uma trilha de fundo e nada mais —, às vezes eles gravam sobre temas urgentes até mesmo um dia antes do lançamento do episódio. O Ivan deixa os convidados bem à vontade para exporem suas opiniões, mesmo sendo polêmicas, e isso traz um diferencial bem legal para o programa. Eu só não ouço mesmo os episódios sobre política, porque já estou, honestamente, de saco cheio disso, e filosofia, por não me interessar muito pelo tema quando discutido a fundo como eles fazem.


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Esse é o principal podcast do portal B9. É essencialmente sobre comunicação e entretenimento, e é apresentado pelo time Carlos Merigo, Luiz Yassuda, Cristiano Dias, Guga Mafra e Luiz Hygino. Os episódios do BrainCast têm em torno de 1h30, e são bem dinâmicos e descontraídos. Só não ouço tudo porque não são todos os temas que me atraem, não sendo tão interessado na área de comunicação, e tendo a ouvir os temas mais genéricos que acabam não sendo abordados pelos meus programas preferidos.


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quarta-feira, 9 de agosto de 2017

Podcasts: 30:MIN, 99Vidas e Agentes do L.I.V.R.O.


Como no post sobre os podcasts que eu ouço eu disse que comentaria sobre cada um, este é o primeiro post dessa série, onde apresentarei 3 programas dos quais ouço tudo o que lançam.



Este é um podcast de literatura, apresentado por uma equipe fixa de três pessoas — o Vilto Reis, a Cecília Garcia e o Jefferson Figueiredo — e editado pelo Luís H. Beber, que eventualmente participa também das gravações. Eles tentam sempre lançar programas dentro da casa dos 30 minutos de duração, e são os herdeiros, digamos assim, do antigo podcast LiteratusCast. São publicados pelo site Homo Literatus. Eventualmente aparecem convidados, mas não é o padrão.

O foco desse pessoal é mais a literatura realista, a mainstream, tendendo para a literatura clássica. Existem tanto episódios que falam de apenas uma obra como episódios falando de autores, temas, listas e duelos muito engraçados entre os participantes, onde um tenta desmerecer a escolha do outro, dentro de um tema. No começo acho que eles exageravam um pouco nas piadas, mas agora eles encontraram um equilíbrio legal. Altos níveis de japonezices, sapos alucinógenos e complexos de Napoleão inclusos.


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Dois temas são recorrentes na minha playlist de podcasts: literatura e videogames. Nesse segundo tema, o 99Vidas é o maior podcast do Brasil. Eles têm uma longa tradição — já estão no episódio 276 —, uma enorme base de fãs (às vezes apaixonados até demais) e lançaram até mesmo um game beat'em up side–scrolling (traduzindo kkk: um jogo de briga de rua em progressão lateral) baseado nos participantes do programa e nas piadas internas dos episódios.

O 99Vidas fala essencialmente de jogos antigos e da nostalgia relacionada a eles. Existem os episódios que falam de apenas um jogo ou uma personalidade do mundo dos videogames; os 2–Pak, que falam de dois jogos geralmente menores; os 4x4, que apresentam quatro coisas — jogos ou consoles, às vezes; os Estilo 99Vidas, que falam de coisas saudosas da época da infância; e os Pancadão, com trilhas sonoras dos jogos. Como todo programa grande, de qualquer gênero ou mídia, os quatro podcasters — Jurandir Filho, Izzy Nobre, Evandro de Freitas e Bruno Carvalho — parecem ter, em igual número, admiradores e haters.


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E voltamos à literatura. Esse é um podcast que eu gosto muito, porque a dinâmica dele é diferente — é sempre um bate–papo entre os dois hosts, Melanie e Thiago (à semelhança do gringo Sword & Laser e do brasileiro O Drone Saltitante, dos quais vou falar futuramente). Eles tratam exclusivamente de literatura especulativa — fantasia, ficção científica e terror. Infelizmente eles estão num hiato desde março, e espero que não desistam :(

O mais legal é que eles têm um entrosamento muito gostoso, e falam tanto de autores e obras quanto de aspectos da escrita. E eles fazem direto tags e listas, que todo mundo adora :D


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domingo, 6 de agosto de 2017

Um trecho marcante de Antônio Xerxenesky


“Quer uma menina para a noite? Ou prefere alguém mais experiente, alguém que esteja à altura de um homem como o senhor…?”
E escorregou a língua na orelha de Thornton, num prolongamento da palavra “senhor”. 
A face do xerife corou inteira. Não ficou claro se por vergonha ou raiva. Ele se levantou, jogando a mão de Maria para o lado, e parado ficou, como para dizer algo, mas nada disse. Tentou exibir o maior desprezo que era possível apenas com o olhar, pois homem vivido era Thornton. 
Ele sabia que naquela terra, que naqueles tempos, o que importava era o que os olhos diziam. Palavras não tinham significado para as pessoas. Eram mal utilizadas. Eram confusas. Eram pervertidas e profanadas por monstros que não sabiam o que fazer com a linguagem. O relevante estava na curvatura da sobrancelha, na tensão dos músculos da face, nas rugas que se formavam na testa. Na paisagem do rosto. Cada rosto era uma montanha 
ou uma floresta 
ou uma planície 
ou um litoral 
ou uma costa 
ou um cânion 
ou um deserto 
como o que cercava Mavrak.

Antônio Xerxenesky — Areia nos dentes



sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Podcasts que eu ouço


Quem me acompanha há mais tempo aqui no blog sabe que a mídia podcast tem ganhado um espaço cada vez maior no meu coração (e no tempo escasso tempo, hehe). Tanto é que eu comecei um podcast próprio —o Rock Pelo Mundo, no site Agregarium, onde eu apresento bandas de rock de diversos países—, e co–criei um com meus amigos Lucas e Matheus — o SobrEscrever, no site Leitor Cabuloso, onde discorremos sobre o ato de criar histórias com palavras.

Assim sendo, acho justíssimo apresentar a vocês os podcasts que eu acompanho, e talvez angariar mais alguns ouvintes para eles :)

Vou separá–los em duas categorias: aqueles que ouço todo e qualquer episódio; e aqueles que ouço dependendo do tema. Não que eu goste mais de uns do que dos outros, é que... mentira, eu gosto mais de uns do que dos outros mesmo, fazer o quê, haha, tenho que ser honesto. Além disso —além de apresentar a lista deles, agora—, vou esmiuçá–los um pouco mais ao longo de posts vindouros, até completar TODOS OS 49 PODCASTS QUE ACOMPANHO :)

Então eis as listas:


PODCASTS DOS QUAIS OUÇO TUDO
(estão em ordem alfabética; não de preferência)
  1. 30:MIN
  2. 99 Vidas
  3. Agentes do L.I.V.R.O.
  4. Biblioteca de Bolso
  5. CabulosoCast
  6. Caixa de Histórias
  7. Clube do Livro CBN — José Godoy
  8. Crazy Metal Mind
  9. Curta Ficção
  10. Escriba Café
  11. Ex Libris
  12. Ghost Writer
  13. JPC Cast
  14. Lançamentos do Metal
  15. LiterárioCast
  16. LivroCast
  17. O Drone Saltitante
  18. Os 12 Trabalhos do Escritor
  19. Papo de Autor
  20. Perdidos na Estante
  21. Pouco Pixel
  22. RapaduraCast
  23. Sword & Laser
  24. Trasgo
  25. Três Páginas
  26. Writing Excuses

PODCASTS QUE OUÇO DEPENDENDO DO TEMA
(também em ordem alfabética)
  1. Alô Ténica
  2. AntiCast
  3. BrainCast
  4. Canal 42
  5. Covil de Livros
  6. Debate de Bolso
  7. Dragões de Garagem
  8. Edição Rápida
  9. Gente que Escreve
  10. Hora Alucinógena
  11. LexCast
  12. Marca Página
  13. Matando Robôs Gigantes
  14. Mundo Freak Confidencial
  15. NerdCast
  16. O Podcast é Delas
  17. Papo Lendário
  18. PapriCast
  19. Rádiofobia
  20. Rádiofobia Classics
  21. Reloading
  22. SpheraCast
  23. WattCast

Como vocês podem perceber, todos os nomes estão linkados para os devidos sites; logo, aguardem, em breve, o começo dos comentários sobre cada um ;)

sábado, 22 de julho de 2017

Extemporâneo, de Alexey Dodsworth


Se há uma coisa que é difícil eu fazer é comprar livros na pré–venda. Sei lá, não vejo urgência em ter algo que não seja de primeira necessidade — e, queiramos ou não, livros não o são. Para que isso aconteça, ou eu tenho que estar esperando desesperadamente um lançamento — cof cof, Os ventos do inverno, cof cof — ou o preço da pré–venda tem que estar lá embaixo. Pois bem: com Extemporâneo não aconteceu nenhum dos dois. Então por quê, Rahmati, você comprou esse livro antes do lançamento?

Simples: porque Alexey Dodsworth se encaminha perigosamente para ser o meu autor de ficção científica nacional favorito. Só não o afirmo abertamente porque ele tem um páreo duro no Luiz Bras.


Extemporâneo conta a vida de uma pessoa como todos nós, que acordamos todo dia num corpo e numa realidade diferente. A grande diferença é que o/a protagonista se lembra disso e nós não. (Ou, ao menos, é isso o que o/a protagonista nos diz.) Mas por que eu estou usando esse “o/a”? Uai, eu não disse que ele/ela acorda todo dia num corpo diferente? Mas tem, ainda, um elemento complicador: não é “todo dia”. É sempre dia 14 de janeiro de 2015. Os dias passados e futuros são ilusões, histórias criadas — pelo seu cérebro ou não — para dar a impressão de continuidade. Pense: você sempre vive no hoje, não é? O ontem é uma lembrança — que pode não ser real —, e o amanhã é só — e sempre — uma expectativa.

Assim sendo, nosso(a) digníssimo(a) protagonista acorda, para começar o dia, no começo do livro, no corpo de George Becker, um brasileiro que vive em uma realidade onde o nazismo é a filosofia reinante no mundo, e há um homem, amarrado nu na sala de estar, sendo torturado pela namorada e por ele — ou, para ser mais exato, pelo “eu” em que ele acaba de cair. Como eu disse, o/a protagonista é diferente dos outros; ele/ela demora a retomar as memórias do novo corpo, e ainda está lutando, nesse início, com as memórias da dançarina espanhola de dança do ventre que era sua identidade antes de dormir.

Mas chega da história e vamos à narrativa. Dodsworth, naturalmente, a constrói com maestria. “Naturalmente” porque eu já esperava isso, por ter lido o excelente Dezoito de Escorpião. Os elementos da história vão sendo apresentados no ritmo certo e de maneira muito eficaz para manter o interesse e aumentar a tensão com a situação esdrúxula que o/a personagem passa. Ele escreve muito bem, também, sem usar de malabarismos para “enriquecer o texto” — o que, invariavelmente, acaba empobrecendo–o. Ele diz o que precisa dizer com as palavras necessárias, assim como Gaiman. A única ressalva aqui é quanto ao trabalho de revisão da editora Presságio, que deixou passar muitos (muitos mesmo!) errinhos de digitação e diagramação. (A minha cópia teve até mesmo um capítulo inteiro repetido.) Há de se ter muito mais atenção quanto a essas coisas, senhores editores e revisores.

No entanto, é claro que isso não diminui a qualidade da obra. Dei 5 de 5 estrelas no Skoob, porque de fato é isso que ela merece. Extemporâneo desconstrói preconceitos, clichês e expectativas de maneira deliciosamente perturbadora :)

Arte de Alexandra Calisto. Não é da obra, mas tem tudo a ver :)

Ah, e já ia esquecendo: quem leu o Dezoito de Escorpião vai gostar ainda mais de Extemporâneo :D


.: E este acabou sendo, sem querer, o quarto livro do Desafio Literário do Marcador de Páginas, de um total de 7 livros, por se encaixar no item “Um livro que se passe em diferentes reinos”! :.

sábado, 15 de julho de 2017

Um trecho marcante de Alexey Dodsworth #2


Pelo visto, essa realidade é como a maioria das outras: uma Inglaterra governada pela rainha Diana e pelo rei Charles. E eu que cogitei ter ido parar nos Estados Unidos! Esse é outro aspecto curioso de acordar em realidades alternativas: as pessoas mudam o tempo todo, tanto quanto eu mudo. Quase toda identidade é contingente. Entretanto, por alguma razão que me escapa, algumas pessoas parecem ser necessárias. Na maioria dos mundos, há uma rainha Diana e um rei Charles. Em alguns poucos, Diana foi assassinada, ou cometeu suicídio, ou fugiu com amantes de ambos os sexos. Sempre há, todavia, uma Diana. Em algumas poucas realidades bizarras, a rainha da Inglaterra de 2015 ainda é Elizabeth em uma versão assustadoramente idosa que dá a impressão de uma múmia ressurreta. Quase sempre há um Jesus Cristo, um Napoleão, um Hitler, um Albert Einstein. E um Michael Jackson! Eu adoro os mundos em que Michael Jackson é um cantor famoso, mas, apesar de ele sempre existir, nem sempre é cantor. Em uma das vezes, pelo que lembro, Michael Jackson havia morrido aos nove anos de idade, vítima de maus tratos parentais, e não passava de um nome num recorte velho da página policial de um jornal americano. A realidade, às vezes, é uma verdadeira bosta. Ora, a quem eu quero enganar? A realidade é sempre meio que uma bosta, a diferença está no tipo de fedor que ela exala.

Alexey Dodsworth — Extemporâneo



Só quero avisar: agora que estou na página 57, e já estou apaixonado por esse livro!

terça-feira, 11 de julho de 2017

Teorema de Mabel, de Matheus Ferraz


.: Este é o segundo livro do Desafio Literário Clube de Autores, de um total de 7 livros! :.


Estou me animando com esse desafio literário! A primeira obra que li já foi a ótima Zé Calabros na Terra dos Cornos, e agora encontro essa também muito boa Teorema de Mabel…! Mas Rahmati, você está dando spoiler da sua avaliação…! Ué, e daí? Tenho obrigação de fazer resenha certinha? :P

Então, já sabendo que eu gostei bastante da obra, leia para descobrir por quê.


Mabel é uma menina que saiu do interior de Minas e foi para o mais–interior–ainda, em busca de um sonho: ser datilógrafa do maior escritor brasileiro vivo, Milton Dantas. (Aqui faço o primeiro parêntese: fui descobrindo aos poucos a época em que a obra se passava, através de poucas pistas soltas ao longo da trama. Ainda não decidi se gostei ou não disso.) Toda menininha, toda sonhadora, toda idealista, Mabel, ao chegar à residência do escritor, no entanto, se vê diante de uma realidade que não era, de forma alguma a que ela esperava. Ela fora escolhida por um motivo — que envolve sua máquina de escrever —, e essa revelação poderia, de fato, acabar com toda a sua essência.

Parece uma ideia promissora, não é? Qual leitor não quer ler histórias sobre livros, escritores e outros leitores? É praticamente um gênero esse tipo de obra, não? A dúvida é: teria Teorema de Mabel sido bem executada, a ponto de nos deixar imergir na trama e apreciá–la devidamente?

E eu digo: com alguns poucos erros, sim! Tanto é, que eu li o livro em praticamente “duas sentadas”, como se diz. Carece de uma revisão mais cuidadosa, mas isso não tira em nada o brilho da trama.

Então falemos dela. Eu não esperava que o livro fosse se tornar o que se tornou. Como eu disse no post do desafio, linkado lá em cima, eu imaginava que seria um realismo mágico mais light, como nos romances do Carlos Ruiz Zafón, mas Teorema não é nada disso! É um livro realista, e já percebi isso logo nas primeiras páginas. Então comecei a pensar que seria uma trama como a maioria das obras mainstream, com foco na forma e não na trama, mas a coisa seguia tão ágil que também não demorei a perceber que essa minha segunda visão também estava errada! Teorema tem uma trama sólida, interessante e bem armada. As personagens surpreendem, são verossímeis e as reviravoltas do final são surpreendentes mas nem um pouco exageradas. Tudo é construído de maneira crua e crível — talvez os dois melhores adjetivos para descrever essa obra, e em suas melhores acepções.

Teorema de Mabel não só merece a leitura como merece sair por alguma editora. Esperemos agora as próximas obras do autor, Matheus Ferraz, que parece ter um futuro promissor.

Nota 3,5 de 5.