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quarta-feira, 29 de outubro de 2014

E se fosse real a "nova reforma ortográfica"?


Motivado por um episódio do CabulosoCast — o episódio #98 —, eu me inspirei para criar um texto escrito da forma em que passaria a ser a nova ortografia da língua portuguesa se fossem adotadas as delirantes mudanças sugeridas nesse boato que circulou pela internet. Esse texto foi citado no episódio #104 desse mesmo podcast, e agora o apresento aqui na íntegra:

Talves ese testo lle kauze alguma estrañeza. Em meu tempo, kontudo, ele está plenamente de akordo kom as hegras gramatikais vijentes. Sei ter avido alguma komosão kuando esas hegras foram aprovadas — oje em dia bastante minimizadas nos livros de istória, komo todas as hevoltas o são — mas, de kualker forma, a grande Akademia Brazileira de Letras, q jerensia nosa língua mãe, já não enfrenta problemas em helasão a tal kestão, bem absorvida pela sosiedade. No entanto, sei q os livros de istória estão ehados. Ouve, sim, uma hevolta sangrenta, imprevista (klaro!) e súbta, não dos “defensores da língua” versus os “hevolusionários”, mas sim entre os profesores (inisialmente apenas os tradisionalistas, mas logo ausiliados por todos os outros kuando as koizas fikaram feias) kontra muintos alunos q viram niso uma xanse de mudar o sistema vijente — e, grasas aos séus, devo dizer, não foram bem susedidos. (A koiza healmente deskambou para a sanginolênsia kuando outros setores da sosiedade entraram no konflito, mas não tratarei diso aki. (Inklusive, ese tipo de hevolta pasou a ser vulgarmente xamada de “vinte sentavos”; talves iso lles fasa mais sentido q a mim...)) 
Enfim; não sei se o sistema de envio temporal terá enviado kohetamente este dokumento à data nele espesifikada; se asim o foi — e devo asumir q sim, por q de outra forma não averia sentido em eskrevêlo — eu o faso justamente para tentar evitar, de alguma forma, tantas mortes, e ajudar asim a fazer esa tranzisão de uma forma mais trankuila. A heforma será feita; a língua brazileira será simplifikada, a partir de então, por ser kompletamente helasionada a seus fonemas — asim sendo, espero q saibam q iso não se pode mudar. Estamos, finalmente, dezasosiados de Portugal e de sua língua portugeza, q, por okazião desa hevolta suprasitada — eles insistem em dizer q não fora por kauza dela, mas apenas koinsidentemente kontemporânea a ela — heinkluíram todos os arkaízmos q lles eram interesantes, diferensiandoa, asim, o másimo q lles foi posível. Oje, Brazil e Portugal são ligados apenas pela istória (e tal fato, infelizmente, levou aos eventos dezagradáveis da Terseira Geha Mundial, mas diso também não devo tratar aki). 
Voltando às mudansas gramatikais. Algumas letras kaíram em dezuzo, komo, por ezemplo, os antigos “C”, “Y” e “W”. Para enkontrálos, tive, inkluzive, de prokurar dentre os símbolos matemátikos. Os fonemas a q esse “C” se heferia atualmente são perfeitamente substituíveis pelos “k” e “s”, e os do “Y” pelo noso bom e vello “i”. Os do “W” eram heferentes aos atuais “u” e “v”. Avia ainda um tal “C sedilla”, também ekivalente ao “s”, q já não se enkontra nem neses símbolos! Aliás (não sei se poso espresar opiniões pesoais, mas agora já era), devia ser uma bagunsa eskrever os mesmos fonemas kom letras diferentes — e, às vezes, uma mezma letra q se lia de três diferentes formas, komo o “x”, que se lia komo “x”, “z” e “s”! Outra mudansa foi em helasão a um sinal xamado ífem, um pekeno traso q separava palavras. Já não se uza esa separasão q, de akordo kom miñas peskizas, okohia em palavras komo mikroondas; parakedas; pikapau; bentivi; joãodibaho; amorperfeito; arkoíris; e nas próklizes, mezóklizes e ênklizes, komo em enkontrálo; fazêlo; extraílo; domináloia; subheptísio... É healmente um dezafio ler livros dos sékulos anteriores ao XXI. 
Sei q ese meu pekeno helato, por demais superfisial, pode nem fazer a diferensa fase à abranjênsia de tudo o q ele jerou, mas mesmo asim devo tentar. Ainda somos limitados em helasão ao tamaño dos testos q podemos enviar ao pasado, mas, de kualker forma, ainda me sobra espaso para um último pedido: Não levem tão a sério a forma komo as koizas são eskritas, mas sim a mensajem q elas estão pasando. Se as linguajens fosem tão importantes, não averiam as tradusões para q todos pudesem entendêlas e apresiálas — e, talvez me estendendo mais do q deveria, peso q também não leiam o q foi eskrito tão ao pé da letra; tentem enkontrar a mensajem okulta atrás dos testos.
Boa sorte, e até um futuro prósimo.


Hodrigo Hamati III

domingo, 19 de outubro de 2014

Um trecho marcante de Douglas Adams


Pareceu a Arthur que todo o céu subitamente se afastara para lhes dar passagem.
Pareceu-lhe que os átomos de seu cérebro e os átomos do cosmos estavam fluindo uns através dos outros.
Pareceu-lhe que estava sendo soprado pelo vento do Universo e que o vento era ele.
Pareceu-lhe que era um dos pensamentos do Universo e que o Universo era um de seus pensamentos.
Pareceu a quem estava no Lord's Cricket Ground que outro restaurante da região norte de Londres havia surgido e sumido, como frequentemente ocorria, e que isso era um Problema de Outra Pessoa.
 O que aconteceu?  murmurou Arthur, muito admirado.
 Decolamos  disse Slartibartfast.
Arthur ficou sentado, imóvel e comovido, no assento de voo. Não sabia ao certo se havia ficado enjoado ou religioso.

Douglas Adams - A vida, o Universo e tudo mais, 1982

sábado, 11 de outubro de 2014

Ensaio sobre a cegueira, de José Saramago


Qualquer livro de Saramago é uma experiência gratificante. Não foi diferente com O Evangelho segundo Jesus Cristo, não foi diferente com Ensaio sobre a cegueira. Grandes histórias, grandes desenvolvimentos, grandes personagens, de um grande escritor. Uma grande trama, simples a início, mas que logo mostra a incrível capacidade do autor de trazer à tona os aspectos mais corriqueiros do dia-a-dia e dar-lhes um novo e profundo significado, uma nova abordagem, uma nova intensidade. Saramago é, para mim, um mestre em dizer o que os outros não conseguem, em escrever o que os outros acham que não precisa ser escrito e, com isso, nos fazer pensar: por que os outros não escrevem assim? Ler um livro dele é perceber a que níveis a escrita pode chegar; nos leva a entender o quê realmente é a literatura, o quê realmente um escritor deve fazer com o seu monte de páginas em branco.

Embora nenhum dos seus personagens  desse livro  tenha nome, cada um deles é notável e marcante; cada um com suas peculiaridades, suas motivações, suas imperfeições, sim, porque pode-se dizer até que são pessoas mais reais que muitas que nós conhecemos. O médico, o primeiro cego, a mulher do primeiro cego, o cão das lágrimas (adorei ele!), o velho da venda, a menina dos óculos escuros  ou a rapariga dos óculos escuros, como ele escreve no português europeu. Essa foi um decisão muito acertada da Companhia das Letras: manter o estilo e a grafia no original, sem adaptações, porque assim podemos perceber exatamente o que passou por sua mente ao escrever  e isso fica, acreditem, perfeitamente nítido através da clareza de sua escrita.

Dizem que essa obra se enquadra no estilo "realismo mágico", ou seja, uma estória realista com um ou poucos elementos irreais ou fantasiosos; talvez isso acabe  em se tratando de Saramago  diminuindo-a. Eu diria, antes, que o que Saramago passa através de seus dedos (em caneta ou teclas) não se limita à realidade, transcende-a, ignora-a em prol do que precisa ser levado aos leitores. A dita realidade é o que menos importa em termos de Saramago; quando ele escreve, o mundo se dobra a ele, em todas as suas particularidades, belezas, feiuras, sutilezas e crueldades  e nenhuma delas, garanto, falta em Ensaio sobre a cegueira.


«««««/5

terça-feira, 7 de outubro de 2014

As tartarugas ninja, de Jonathan Liebesman


Quase não fiz esse post; muita coisa já foi dita sobre esse filme pela internet... Contudo, o blog é meu e eu dou a minha opinião e pronto =)

O filme já saiu dos cinemas, mas tenho ouvido tantos comentários nonsense que não consegui ficar calado. O filme é bestinha, sim, mas, gente, pelo amor de Deus, é um filme baseado num desenho animado que foi baseado em quadrinhos que falam de tartarugas humanoides gigantes lutadoras de ninjutsu! E com nomes de pintores renascentistas! Treinadas por um rato de esgoto! Que comem pizza! E ainda querem um filme sério???

Poderiam dizer: o roteiro ficou mal feito. Tem furos, eu concordo, mas, gente, é cinema pipoca! Para crianças e adolescentes, em sua maior concepção. O vilão quer ficar milionário, soltando um gás que vai deixar todos da cidade doentes e depois vender o medicamento, e, para que ninguém saiba que foi ele, faz isso numa antena gigante em cima de seu próprio prédio. Não faz nenhum sentido, mas o desenho também é assim. Tem até mais idiotices no desenho que no filme, diga-se de passagem. O Clã do Pé — atentem para o nome! — é muito mais legal no filme; disso parecem esquecer.

E os efeitos especiais? Como ouvi num podcast, os humanos (reais, vale lembrar) parecem mal feitos perto das tartarugas, hehe. O novo design delas me agradou bastante, o tamanho delas também, e a April O'Neil... Ai ai. Melhor nem falar. (Minha esposa fala "ai ai" pro Khal Drogo, então não pode reclamar!) E a cena do elevador é simplesmente incrível.

Enfim, o filme foi bastante satisfatório para mim. Saí do cinema sorrindo, leve e entretido. Exatamente, creio eu, o que o diretor quis.


«««/5

domingo, 5 de outubro de 2014

Dá pra acreditar na Urna Eletrônica?


Ainda não fui votar nessas tristes eleições de 2014 para presidente... A motivação está bem oculta, difícil de ser encontrada, quando paira no ar tamanha dúvida sobre o sistema que o Brasil usa para a votação.

Será que podemos acreditar mesmo na urna eletrônica...? Sabemos todas as coisas de que a informática hoje é capaz; seria tão difícil assim instalar um programa que solte um relatório inicial com todos os candidatos com 0 votos, e depois, na hora das apurações, um relatório final que cuspa um resultado já pré-programado?

Sempre tive esses questionamentos, mas agora, com um aplicativo chamado Boca de Urna, para Android e iOS, que, até esse momento, tem mais de 35 mil intenções de voto cadastradas, e que mostra uma discrepância tão grande entre as pesquisas "oficiais", do IBOPE e DataFolha... Nesses dois "grandes", a Dilma Rousseff tem mais de 40% das intenções, quando no aplicativo ela tem apenas 10%... Sei que existem as questões dos chamados currais eleitorais, mas, mesmo assim, não deviam esses institutos também fugir deles...? Segundo o Boca de Urna, teríamos 2.º Turno, mas entre Aécio Neves, em primeiro, com 40 e tantos por cento, e Marina Silva, em segundo com 20 e poucos. Outra discrepância é em relação às pesquisas para a candidata Luciana Genro, com 6% no aplicativo, muito além dos 1% que a mídia televisiva lhe dá... Na minha interpretação, esse 1% fajuto vem a calhar quando a intenção é minimizar a força que a candidata tem com um tempo de propaganda muito menor que o dos principais candidatos... E, assim, atrapalhá-la em eleições futuras...

Longe de mim estar dizendo que o voto em cédulas de papel é mais seguro; de forma alguma  é tão "roubável" quanto o eletrônico. Tudo o que eu gostaria é de ter certeza que a escolha do povo seria a mesma televisionada à noite...

E, assim, fazer valer a gasolina que eu vou gastar para me deslocar até a escola onde voto.

Seria assim a verdade...?

sábado, 4 de outubro de 2014

Um trecho marcante de José Saramago


Então aconteceu o que tinha que acontecer. Ouviram-se tiros na rua. Vêm-nos matar, gritou alguém, Calma, disse o médico, devemos ser lógicos, se quisessem matar-nos era cá de dentro que viriam disparar, não lá fora. Tinha razão o médico, foi o sargento quem deu a ordem de disparar para o ar, não foi um soldado que de repente tivesse cegado quando estava com o dedo no gatilho, compreende-se que não houvesse outra maneira de enquadrar e manter em respeito os cegos que saíam aos tropeções dos autocarros, o ministério da Saúde tinha avisado o ministério do Exército, Vamos despachar quatro camionetas deles, E isso dá quantos, Uns duzentos, Onde é que se vai meter toda essa gente, as camaratas destinadas aos cegos são as três da ala direita, segundo informação que temos, a lotação total é de cento e vinte, e já lá estão sessenta ou setenta, menos uma dúzia que tivemos que matar, O caso tem remédio, ocupam-se as camaratas todas, Sendo assim os contaminados vão ficar em contacto directo com cegos, O mais provável é que, mais tarde ou mais cedo, esses venham a cegar também, aliás, tal como a situação está, suponho que contaminados já estaremos todos, de certeza não há uma só pessoa que não tenha estado à vista de um cego, Se um cego não vê, pergunto eu, como poderá transmitir o mal pela vista, Meu general, esta deve ser a doença mais lógica do mundo, o olho que está cego transmite a cegueira ao olho que vê, já se viu coisa mais simples, Temos aqui um coronel que acha que a solução era ir matando os cegos à medida que fossem aparecendo, Mortos em vez de cegos não alteraria muito o quadro, Estar cego não é estar morto, Sim, mas estar morto é estar cego, Bom, então vão ser uns duzentos, Sim, E que fazemos aos condutores dos autocarros, Metam-nos também lá dentro. Nesse mesmo dia, ao fim da tarde, o ministério do Exército chamou o ministério da Saúde, Quer saber a novidade, aquele coronel de quem lhe falei cegou, A ver agora que pensará ele da ideia que tinha, Já pensou, deu um tiro na cabeça, Coerente atitude, sim senhor, O exército está sempre pronto a dar o exemplo.
José Saramago - Ensaio sobre a cegueira, 1995