Como uma ideia que surgiu no Facebook — e, logo, que todo mundo repetiu —, eu também não podia ficar de fora: criei meu próprio mapa de influências enquanto escritor.
No entanto, gostaria de comentar mais sobre cada um dos autores mencionados e como eles me influenciaram.
Quando — para quem é escritor — chegamos àquele famoso momento, “quero escrever assim”, é, via de regra, porque nos deparamos com obras que nos tocam profundamente. Podemos dividir, ainda, essas obras em dois grupos: a dos escritores que nos encantam, e a dos mundos que nos encantam. Ou dizemos “quero escrever assim” ou “quero criar um mundo assim”. É, precisamente, nesses dois grupos que estão as quatro pessoas que ocupam os maiores quadros nessa montagem: Neil Gaiman, Stephen King, Hironobu Sakaguchi e J. R. R. Tolkien.
Primeiramente, Neil Gaiman. A obra dele condensa ambos os encantamentos — me encanta enquanto escritor, por dizer tanto com tão pouco, por criar climas e trazer à tona tantos sentimentos com frases simples, fugindo do rebuscamento, precisas e diretas, e ainda assim poéticas; e me encanta enquanto criador de mundos, porque o que ele fez em Deuses americanos, Os filhos de Anansi e O oceano no fim do caminho — suas obras que se passam em seu mundo de deuses — inspiraram boa parte da minha produção. Um conto meu que é totalmente inspirado na obra de Gaiman é o Nil.
Stephen King me ensinou a construir personagens. Pode–se falar o que for de suas obras (o que, na maioria das vezes, eu não concordo), mas não se pode falar que ele não é genial na construção de seus personagens. Com ele, eu percebi que todos os personagens têm uma opinião formada em relação a absolutamente cada aspecto de suas vidas, e isso afeta sua maneira de ser. Que os aspectos da vida de cada um forma o que eles são. Na obra de Stephen King, é facílimo perceber que, se os personagens envolvidos em suas tramas fossem outros, essas mesmas tramas iriam por caminhos muitíssimo diferentes. São os personagens que criam as tramas, e não o oposto. Foi por causa dele que fiz o que fiz em O arquivo dos sonhos perdidos, e que é criticado por algumas pessoas: pus personagens “comuns” numa trama épica, e o modo como eles são — ou não são — altera totalmente o que poderia se esperar da história.
Hironobu Sakaguchi entra no outro campo — o dos construtores de mundos. Para quem não conhece, ele é o criador da série Final fantasy, e essa série é a maior responsável por eu misturar magia e tecnologia em minhas obras — especialmente o que ele fez em seus “episódios” VII e XII. Sakaguchi, ao criar esses mundos, mostrou como magia e tecnologia podiam coexistir e se completar, e isso abriu minha mente para novas possibilidades. Isso, combinado com o que J. R. R. Tolkien fez em O senhor dos anéis, e que dispensa totalmente apresentações e exaltações, me fez perceber que sim, eu podia criar um mundo que juntasse tudo o que eu gosto, desde que, para isso, ele tivesse coerência — o que, no meu modo de ver, foi onde esses dois mestres mais brilharam: dar coerência para mundos totalmente fantásticos. (Nesse aspecto, mas em menor monta, coloco também o Shigeru Miyamoto, e especialmente pelo que ele fez em The legend of Zelda. Boa parte da estrutura de O arquivo é inspirada em Zelda, que me marcou muito graças à maestria de Miyamoto em criar aventuras e sub–aventuras que acabam se ligando em uma trama maior. É uma influência muito mais quanto ao “clima” da aventura, baseada em sensações, do que em elementos de trama em si — mas que não podia ser negligenciada.)
Os outros, com as fotos menores, podem ser divididos entre os que tiveram influência no início da minha escrita — ou para que eu a iniciasse, por assim dizer —, e os que estão me influenciando por agora. Dos primeiros, que me motivaram a escrever e criar histórias, estão Jules Verne e Leonel Caldela. Minha adolescência e início da vida adulta foram lendo as obras de Verne, e, mais uma vez, aquele tom de aventura e descoberta de seus livros me encantavam enormemente, e isso se refletiu n'O arquivo. Já o Caldela foi diretamente responsável por esse livro de fato existir. Através de seu romance O inimigo do mundo eu percebi que, sim, um mundo fantástico poderia ser transformado em uma história “realista” e brutal, e, durante a escrita, eu fraquejei, como o fazem muitos autores iniciantes. No finado Orkut, então, eu perguntei a ele como ele conseguiu realmente levar a cabo aquela tarefa ingrata de escrever um romance longo, e, ao contrário da minha expectativa, ele respondeu — e ainda me deu um puta incentivo para continuar. Imagino que, se ele não o tivesse feito, talvez eu não fosse um escritor hoje em dia…
Os que faltaram são os que estão me influenciando atualmente. De forma parecida com o King, o Ray Bradbury também me influencia a voltar meus olhos durante a escrita para os personagens — e ele, também como Gaiman, me mostra que pode haver poesia no modo de escrever. No entanto, enquanto o Gaiman me pauta a forma de criar fantasia e o King a de criar histórias realistas ou de suspense, o Bradbury é meu maior exemplo no campo da ficção científica. Ele me mostra que esse gênero deve ir muito além dos tecnicismos e focar no que realmente importa: as pessoas. Um conto curto em que eu aplico isso é o A distância e a espera. Já o Douglas Adams foi quem me ensinou a colocar ironia, cinismo e sarcasmo de maneira inteligente em meus textos, e que esse tipo de humor é muito melhor do que a comédia escrachada, que não vai bem na literatura — e que rir de si mesmo é a melhor maneira de rir da humanidade. Além, é claro, de usar o nonsense para compôr o humor causado pelo estranhamento — e que fiz no conto Aquecimento global (Em fogo alto). O Haruki Murakami foi o penúltimo a ter adentrado esse rol de escritores, e é um dos meus preferidos da atualidade. Existem outros preferidos que não entraram na lista de influências, e por quê? Porque Murakami me ensinou algo que nenhum dos outros pôde: a ter calma para contar minhas histórias. A dar atenção a pequenos detalhes do cotidiano, a sentimentos, a impressões, a eventos banais e que acabam influenciando um personagem muito mais do que parece. E, também, além disso, a incluir eventos esdrúxulos em minhas histórias fazendo–os parecer perfeitamente banais e corriqueiros, hehe. Talvez o meu conto que mais reflita isso seja o Into blue. E, por último, o cineasta David Lynch, que merece um parágrafo próprio.
Existem modos e modos de se contar histórias. Existem jornadas do heróis, existem narrativas epistolares, existem outros tipos de storytelling… e existem as colchas de retalhos de Lynch. Assistir a um filme dele não é fácil, mas é recompensador. Bom, talvez não seja recompensador na primeira assistida, haha, mas se você persistir e revê–lo, talvez mais de uma vez, as coisas começam a fazer sentido… ou não! Mas a intenção de Lynch nunca foi a tradicional de passar uma mensagem clara; pelo contrário, ele espera que o expectador construa sua própria versão dos fatos, e entenda a história de sua própria maneira. Tudo bem que eu acho que ele passa um tanto da conta às vezes, hehe, mas o que ele me ensinou é que existem outras maneiras de contar as histórias, e, especialmente, maneiras que exijam atenção, reflexão e o raciocínio daquele que está consumindo sua história! Fiz isso em minha última obra publicada, o conto Sob a sua árvore, e estou fazendo no romance que estou escrevendo, totalmente diferente de qualquer outra coisa que eu já publiquei. Nessas duas obras, se o leitor não prestar atenção e raciocinar sobre o que está lendo, pode ter certeza de que chegará ao final com um gosto estranho na boca. E, arrisco dizer, que esse modo de contar histórias irá pautar boa parte da minha produção de agora em diante…
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