Acabei ontem a leitura do romance A cidade dos milagres, do podcaster Christian Gurtner, que mantém o maravilhoso site Escriba Café — na verdade, cheguei ao romance clicando no link da loja Tempus Emporium, vinculada ao site.
O livro é pequeno, menos de 150 páginas, e de leitura simples. No entanto, é difícil falar sobre ele. Difícil mesmo. Ele varia entre dois plots principais: uma trama policial e outra onde vemos a construção do caráter de um personagem, e que serve de base para reflexões sobre o mundo atual (para quem acompanha o site do autor sabe que esses são os seus próprios pensamentos) — e ambas as tramas giram em torno do personagem Dom Aligneri.
A história, embora seja simples, tem justamente aí sua força. O desenvolvimento do livro soa quase como uma fábula, uma visão romantizada e irreal do mundo; contudo, no desfecho, percebemos que Gurtner não perde o foco com a realidade, ainda que a última cena de "fuga" seja quase surreal — mas, dadas as circunstâncias, perfeitamente compreensível. Quem, afinal, nunca presenciou pelo menos uma cena surreal em sua própria vida?
Os personagens são simples, unilaterais, mas dado o caráter fabulesco da obra, pode-se aceitar que eles estão ali apenas para fazer a mensagem ser passada — contudo, ainda assim, algumas páginas poderiam ter sido acrescentadas na obra final para... humanizá-los mais, no sentido de mostrar uma vida pregressa mesmo. Não que as informações dadas sobre eles tenham sido insuficientes; apenas foi um desejo meu de entrar mais na cabeça deles.
Outra coisa que precisa ser levada em consideração: o livro é de 2005, ainda nos primórdios da obra de Gurtner no Escriba Café, e me deixa imaginando o romance que sairia de sua cabeça agora, depois de toda aquela experiência que ele adquiriu.
Agora, em um ponto, uma crítica dura tem que ser feita — a edição. Entendo que a Editora Scortecci é uma editora de livros sob demanda, mas ela realmente pecou na revisão. São muitos erros de pontuação, inúmeros mesmo, e percebe-se claramente que a) ou não houve um serviço de edição, ou b) o editor que revisou a obra é incompetente. Todos os escritores deixam inúmeros erros para trás durante o processo de escrita, que são lapidados numa segunda leitura ou numa revisão cuidadosa — que inclusive corrige vícios e inexperiências no uso da linguagem dos novos autores —, mas percebe-se claramente que isso não foi feito aqui. Essa falha não chega a comprometer a história e o que o autor quer nos passar, mas que dá raiva, dá. E isso tem um nome: desleixo com o autor.
Mas enfim. O livro merece sim uma segunda edição — com revisão — por uma editora melhor, e eu gostaria muito que o Christian Gurtner nos brindasse com mais uma obra (não sei se está em seus planos ou não). Ele é um cara que tem muito o que dizer, e sempre com muita qualidade. Em resumo, a nota só não saiu um pontinho melhor por causa da edição.
«««/5
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